Foi assim, mesmo antes de nascer aquela incerteza. Lista de nomes femininos, lista de nomes masculinos e lista de nomes unissex. Eu sempre quis saber quais eram os nomes unissex, mas achei que não faria bem para a formação do meu caráter na infância. Enfim, depois de alguns meses mesmo com a confirmação do exame, o médico, ao puxar-me pelas mãos do ventre de minha mãe, disse: é um menino, veja que mãos grossas! Os outros médicos olharam abismados para mim, eu ainda com os olhos fechados tentando respirar gritei: "sou mulher, ora porra!". E eu nascia com um vocabulário vasto e com orelhas avantajadas, provindas de meus genes nordestinos paternos e patéticos. Minha mãe muitas vezes foi uma pessoa inteligente. Na verdade, acho que ela sempre foi.
Quando entrei na escola, no jardim de infância, minha afinidade me levava à ala dos que gostavam de azul. Nunca fui aceita na rodinha das que usavam rosa e brincavam de serem mães tão precocemente, sem conhecimento de métodos contraceptivos. Nesse aspecto, eu sempre fui a última a fazer tudo. E tudo inclui tudo mesmo. Eu brincava de pegar ladrão, andava de patins.Caía. Ralava os joelhos e tornozelos. Sempre tive o andar meio torto. Eles me pegavam pela mão e me chamavam de parceira. Eu gostava daquilo.
Colocaram-me na aula de balé, sapateado, jazz, piano, xadrez (veja só, xadrez!), natação. Eu me coloquei nas artes marciais. Para a tristeza de uma mãe que queria uma filha feminina, com amigas no quarto rosa, foi mais uma surpresa. Eu sempre dei muitas emoções pra minha mãe e me orgulho disso. No Kung fu eu podia ser tudo aquilo que gostaria ser sem deixar de ser quem eu era. Complicado, eu sei, mas só eu sei. Com as minhas mãos que dificilmente tinham calos, mais uma vez me destacava dentre aqueles que estavam ali para se auto afirmar, para aprender a brigar na rua ou pagar de admiradores das coisas exóticas do oriente. Segurei forte as oportunidades que tive. Fui até as últimas do meu corpo e dos meus joelhos. Com as mãos. Sobre elas, eu tentava explicar que era genético, herdado, mas gostava de pensar que eram só minhas e eu tinha o privilégio de tê-las minhas em todo o meu egoísmo manístico. humanístico de certa forma.
Larguei as cordas de violão e guitarra para usar minhas mãos na bateria. Me achei denovo. Sempre soube que não era da minha essência tanta sutileza harmônica. Tons, batuques, ritmos, velocidade, bit, vibe, emoção, adrenalina, extasy. O que importa é aquela coisa que eu não sei explicar, aquela mágica da música que entra. A música é uma coisa maravilhosa. Tudo do corpo, da alma, das mãos. Deu até vontade de chorar agora.
Enquanto isso, cumprimentando pessoas que se assustavam, levantei e dei os dois passos mais importantes da minha vida: passo na faculdade e passo a ter consciência do que vou um dia ser. Essas coisas de natureza nunca foram meu forte mas estava escrito nas mãos. Quem diria que um dia eu, pequena menina burguesa mimada, pegaria numa enxada, cavaria solos, tocaria árvores, sentiria a textura do pêlo macio de um bicho-preguiça, faria cálculos volumétricos ou mesmo faria manejo de frutíferas na beira de um rio tão grande, mas tão grande quanto a incerteza, de barco quase dentro dele, do rio, quase parte do fio do horizonte. Ninguém diria.
Não há creme hidratante que dê jeito. Tratamento de estética, macumba ou promessa para são-qualquer-coisa. Não há cartomante ou cigana que diga o contrário. O meu destino? Ora o meu destino quem diria: está escrito nas mãos.
Quando entrei na escola, no jardim de infância, minha afinidade me levava à ala dos que gostavam de azul. Nunca fui aceita na rodinha das que usavam rosa e brincavam de serem mães tão precocemente, sem conhecimento de métodos contraceptivos. Nesse aspecto, eu sempre fui a última a fazer tudo. E tudo inclui tudo mesmo. Eu brincava de pegar ladrão, andava de patins.Caía. Ralava os joelhos e tornozelos. Sempre tive o andar meio torto. Eles me pegavam pela mão e me chamavam de parceira. Eu gostava daquilo.
Colocaram-me na aula de balé, sapateado, jazz, piano, xadrez (veja só, xadrez!), natação. Eu me coloquei nas artes marciais. Para a tristeza de uma mãe que queria uma filha feminina, com amigas no quarto rosa, foi mais uma surpresa. Eu sempre dei muitas emoções pra minha mãe e me orgulho disso. No Kung fu eu podia ser tudo aquilo que gostaria ser sem deixar de ser quem eu era. Complicado, eu sei, mas só eu sei. Com as minhas mãos que dificilmente tinham calos, mais uma vez me destacava dentre aqueles que estavam ali para se auto afirmar, para aprender a brigar na rua ou pagar de admiradores das coisas exóticas do oriente. Segurei forte as oportunidades que tive. Fui até as últimas do meu corpo e dos meus joelhos. Com as mãos. Sobre elas, eu tentava explicar que era genético, herdado, mas gostava de pensar que eram só minhas e eu tinha o privilégio de tê-las minhas em todo o meu egoísmo manístico. humanístico de certa forma.
Larguei as cordas de violão e guitarra para usar minhas mãos na bateria. Me achei denovo. Sempre soube que não era da minha essência tanta sutileza harmônica. Tons, batuques, ritmos, velocidade, bit, vibe, emoção, adrenalina, extasy. O que importa é aquela coisa que eu não sei explicar, aquela mágica da música que entra. A música é uma coisa maravilhosa. Tudo do corpo, da alma, das mãos. Deu até vontade de chorar agora.
Enquanto isso, cumprimentando pessoas que se assustavam, levantei e dei os dois passos mais importantes da minha vida: passo na faculdade e passo a ter consciência do que vou um dia ser. Essas coisas de natureza nunca foram meu forte mas estava escrito nas mãos. Quem diria que um dia eu, pequena menina burguesa mimada, pegaria numa enxada, cavaria solos, tocaria árvores, sentiria a textura do pêlo macio de um bicho-preguiça, faria cálculos volumétricos ou mesmo faria manejo de frutíferas na beira de um rio tão grande, mas tão grande quanto a incerteza, de barco quase dentro dele, do rio, quase parte do fio do horizonte. Ninguém diria.
Não há creme hidratante que dê jeito. Tratamento de estética, macumba ou promessa para são-qualquer-coisa. Não há cartomante ou cigana que diga o contrário. O meu destino? Ora o meu destino quem diria: está escrito nas mãos.
2 comentários:
Mãos que julgam condenando.
que criam a bomba pra
destruir a natureza.
que ferem acariciando
e que também semeiam
amor com certeza!
que falam, leêm e escrevem
que tocam música. Bateria!
que fazem magia, curam a dor, fortalecem, alimentam o corpo,
plantam e colhem uma flor.
grande título esse:
o de ter nas MÃOS menina,
o poder da criação!
de uma sutileza e profundidade incrível. fiquei em êxtase.
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